quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

No teu aniversário



Sobes a pulso cada degrau da tua escada.
Segues a direção que escolheste,
o rumo que a bem ou a mal traçaste,
a página que escreveste e viraste!
Indiferente à dor, à lágrima espalhada,
os frutos silvestres que colheste
tingem-te a boca do roxo que semeaste,
nos arlequinescos carnavais que comemoraste.
Vejo-te ainda, menino na caminhada,
nos calções caqui que não rompeste
e nas botas de couro que nunca estreaste,
distante desse futuro que não planeaste.
Vejo-te de novo, agora, quase no final da estrada
nos sinais do quanto envelheceste,
sulcos profundos que no rosto guardaste,
marcas que na tua alma aprisionaste.
E cada ano conquistado é uma vida adiada
nos silêncios que criaste e não rompeste,
nas tantas mulheres que tiveste e não amaste,
nos sonhos que quiseste e não sonhaste.
Cada filho, cada sombra, cada cilada,
que no peito, pássaro ferido, acolheste
não te exime da ilha em que te transformaste,
do mar tenebroso de que te rodeaste.
Criando a máscara mais adequada,
corrimão a que te agarras e mereceste,
habitas o herói nu que personificaste
e escondes-te no negro quadro que pintaste.
Encostas, agora, o rosto cansado à almofada
recordando o filme do tanto que viveste.
No presente aniversário completaste
outro xadrez do jogo solitário que jogaste…


Isabel Branco


Sem comentários: