quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

FÉMINA



O ínfimo espaço que preencho no universo,
a força uterina que me move desde o berço
na inevitável rotação dos dias
e na órbita e translação do pensamento,
veste a suavidade das cambraias,
a ternura, a emoção, o descobrir, o ser,
os cetins, as sedas, a luxúria e o prazer
entre quentes véus e lantejoulas frias.
As negras rendas nas bainhas das mil saias,
rasgam-se na voracidade das horas,
no drama quimico das partículas e das moléculas
que me trouxe, no mistério umbilical de existir,
ao propósito indefinido da matéria
e na alquimia da mente, do consciente e do inconsciente,
me usa e consome e me espalhará pelos séculos
em pó e cinzas gravitacionais...
Reparte-se em centelhas
o macio vidro das meias,
rios e mares os cabelos penteiam
e sombras sulcam rugas nos espelhos do tempo...
Na sofrega vermelhidão das magnólias desabrochadas,
ao despertar de cada manhã,
entre os lençóis de linho bordados
com cheiros de alfazema e romã,
esconde-se um corpo alvo e indolente
na patética vontade do sangue
e no bater compassado dum coração
que se espreguiça, se levanta de coragem
e, de saltos altos, ruma ao desconhecido
humana e feminamente vestido!...

Isabel Branco

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